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Notícias e Destaques 03 Jul 2020 Solar Condes de Resende: a figura de Rentes de Carvalho Veja a explicação de Gonçalves Guimarães



"José Rentes de Carvalho é um grande escritor português, nascido no dia 15 de maio de 1930, num lugar chamado Monte dos Judeus, em Santa Marinha, no centro histórico de Gaia. Depois aqui viveu durante 15 anos até que, por razões profissionais do pai, que era guarda fiscal, teve que se mudar para Viana do Castelo e depois daí para Lisboa, onde estudou na Universidade, fez a tropa, e depois foi ao mundo, para Paris, para o Brasil, para Nova Iorque, e acabando por se fixar na Holanda, onde ainda hoje reside parte do tempo, que vai alternando com permanências regulares em Estevais de Mogadouro, uma aldeia de Trás-os-Montes, de onde eram os seus antepassados.

A sua vivência em Vila Nova de Gaia está descrita num notável romance, que podemos dizer que é o melhor livro de ficção sobre o centro histórico de Vila Nova de Gaia, descreve muitíssimo bem o que era a paisagem ribeirinha e a azáfama do rio e das pessoas que aí viviam, entre 1930 e 1945 quando, naturalmente, o centro histórico tinha outra vida diferente da que tem hoje. Portanto, esse romance tem várias edições, quer em Portugal, quer na Holanda, aliás, começou por ser um sucesso, como quase todas as suas obras, na Holanda, dado que José Rentes de Carvalho foi professor na Universidade de Amesterdão durante uns anos, e começou por ser mais conhecido na Holanda como um grande escritor português do que propriamente em Portugal. Apesar de tudo, foi publicando regularmente, nunca deixou de estar presente para os seus leitores fiéis, desde o seu primeiro romance publicado em 1968, chamado "Montedor”.

"Montedor”, que é exatamente uma segunda fase da sua vida em Viana do Castelo. Depois outros sucederam até à atualidade, tem uma vasta bibliografia publicada, mas também foi jornalista, também foi cronista de sucesso, escreveu um livro chamado "Portugal para Amigos”, que é um guia de visita a Portugal um pouco diferente dos guias habituais, com o qual os holandeses visitam o nosso país e, em cada terra, procuram o que de mais humano, de mais histórico, de mais monumental, mas também de mais gastronómico essa terra tem, mas também aqueles faits divers do quotidiano, aquelas coisas que fazem diferença de uma terra para outra.

Regressando à questão de "Ernestina”, é realmente um romance, ao mesmo tempo autobiográfico mas, obviamente, em que, como já faziam outros escritores, não é um diário, não é a vida do escritor. É a vida que o escritor via da janela da sua casa, ou nas suas deambulações pela escola primária, pela vida ribeirinha, do cais, pela chegada dos bacalhoeiros, etc. Aqui, na parede, temos exatamente a recriação da casa onde nasceu José Rentes de Carvalho, ainda existe, e está aqui uma recriação de uma pintura de Adélio Martins, de como ela seria na época em que nasceu, portanto, seria nos anos 30. Ela hoje está um bocadinho diferente, mas esta recriação foi feita baseada na descrição de "Ernestina”. E também temos ali um outro quadro, em que – a escrita de Rentes de Carvalho é muito cenográfica, quer dizer, ele presta uma grande atenção ao pormenor da paisagem onde as coisas decorrem – e então estamos a ver uma recriação daquilo que ele via da janela do seu quarto, nomeadamente a chegada do seu pai pelas escadas do Monte dos Judeus. E aqui, um retrato mais recente de Rentes de Carvalho na sua aldeia, na sua também aldeia de Estevais de Mogadouro onde, como eu disse, visita frequentemente, alternando com as estadias em Amesterdão. Depois, temos aqui nesta casa, no Solar Condes de Resende, não só o busto de Hélder de Carvalho, que acabamos de ver lá em baixo, que foi feito na homenagem que o Município lhe prestou muito recentemente, e também a Confraria Queirosiana se associou a essa homenagem mandando fazer aquele busto que o retrata na atualidade, dado que ele fez recentemente 90 anos e continua a escrever e a criar. Mas também temos aqui algum espólio pessoal, nomeadamente a sua condecoração de Comendador da Ordem do Infante, aqui no carimbo de tradutor oficial do governo holandês, e ali também as suas máquinas de escrever. Ou seja, hoje ele bloga quase todos os dias, é um homem que tem o seu computador sempre à mão, debaixo do braço, mas guardou com especial carinho as máquinas de escrever portáteis, com que escrevia crónicas nos jornais quando ia de avião de um lado para o outro, e também o seu primeiro computador, que ainda funciona e, portanto, com o programa MS-DOS, onde compôs muitos dos textos que depois deram origem aos seus livros de sucesso. Temos também aqui variadíssimas edições, quer holandesas, quer portuguesas, e temos ainda os livros das traduções que ele promoveu para os holandeses conhecerem um escritor chamado Eça de Queiroz. Foram traduzidas as cinco principais obras de Eça de Queiroz para holandês, graças às diligências de José Rentes de Carvalho. E, assim, os holandeses ficaram a conhecer, alguns poderiam já conhecer Ramalho Ortigão que, como sabemos, escreveu um livro sobre viagens pela Holanda, mas os holandeses conhecem Fernando Pessoa, José Saramago e Eça de Queiroz, além do próprio Rentes de Carvalho, obviamente, graças a esse escritor, que promoveu a tradução das principais obras de Eça de Queiroz para holandês”.

Gonçalves Guimarães